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A mostrar mensagens de julho, 2016

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (25 de Julho de 2016) (Passado)

Passeava na praça Blaha Luzja em Budapeste às duas da manhã quando um senhor com uma cara única me chamou a atenção. Tinha cerca de 60 anos e uma expressão dura difícil de qualificar. Parecia que todas as coisas terríveis já se haviam passado na sua vida. Tentei adivinhar a sua história: os seus avós haviam sido massacrados na Segunda Guerra Mundial, dois queimados e os outros lançados ao Danúbio; os seus pais haviam sido presos e torturados pelos nazis, mas conseguiram escapar para depois desaparecerem levados pelo carro negro dos comunistas, nunca mais apareceram; a sua mulher havia morrido a dar à luz o seu segundo filho; a sua filha morrera atropelada nos anos 90 ou desaparecera, raptada pelos alcoviteiros de produções pornográficas. Não sei, não faço ideia, posso apenas deduzir. A única coisa que posso dizer é que ele tinha um inolvidável rosto de sofrimento, uns olhos tristes focados no vazio, revoltados com a vida e uma dor imensa na alma, que contribuía para acentuar a monument

Não Gosto (52) (PP)

Não gosto nada das traduções que Jorge de Sena fez das obras de Ernest Hemingway . Só li dois livros de Hemingway traduzidos por ele, O Velho e o Mar e Fiesta (The Sun Also Rises) . O Velho e o Mar já li há algum tempo, não me recordo ao certo das passagens que mais me revoltaram e desiludiram, mas agora ando a ler Fiesta, que encontrei e roubei de um Hostel de Budapeste, que, para minha grande surpresa tinha um livro em português. Há muitas passagens que me deixaram imensamente estupefacto, vou dar apenas alguns exemplos: “Durante certo tempo a paisagem era bastante a mesma”, “Cohn ia ver se arranjava a fazer a barba”, “Em poucos momentos a choca o foi buscar, amansou-o e fez dele parte da manada”. Recordo que isto são só exemplos. O livro está recheado de frases que não fazem qualquer tipo de sentido, parecendo ter sido escritas por crianças. Para além desses erros há uma frase em que o “há” é trocado por “à”, uma nota de rodapé em que Jorge de Sena se refere aos “peles-vermelhas”,

Não Gosto (51) (PPP)

Detesto aquelas homens que se sentam ao pé de mim nas camionetas de longa distância quando há mais bancos livres e odeio particularmente este gordo que está sentado ao pé de mim enquanto escrevo. Possivelmente fazem-no para cumprir o número do lugar no seu bilhete, mas é inacreditável que continuem lá sentados quando há mais lugares livres. Mas...o que há de errado com estas pessoas? Não querem ir à janela? Preferem estar apertadas num banco durante duas horas em vez de estarem à larga em dois bancos...? E eu não me consigo ir embora sem o fazer levantar e sinto que poderia cair-lhe um bocado mal, era como se eu lhe dissesse, 'desculpe, não quero estar mais à sua beira, vou ali para trás, adeus, boa tarde'. Neste preciso momento estou encurralado por um gordo numa camioneta para o Porto, mas, ao menos, tenho um lugar à janela para ir escrevendo a minha raiva enquanto o meu ódio por ele vai crescendo e vou vendo a paisagem desenrolar-se lá fora. Quando saímos de Faro ele entrou

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (14 de Janeiro de 2016)

Estava na Fnac a ver os discos e um grupo de raparigas adolescentes estava a tentar decidir que disco comprar. Não reparei quais eram os discos que se propunham a comprar, mas vi bastantes discos dos Muse  no sítio onde elas estavam. Queriam levar dois discos. Uma delas fazia as contas ao dinheiro que tinha e a quanto custavam os discos, quando uma outra soltou esta frase monumental: - Faz as contas no telemóvel, porque é que estás a usar a cabeça? PORQUE É QUE ESTÁS A USAR A CABEÇA? Quando estas palavras chegaram aos meus ouvidos não pude evitar largar uma imensa gargalhada tonitruante. Nem sequer consegui manter-me de pé, dobrei os joelhos, inclinando-me e agarrei-me à prateleira onde estavam os discos a 40 centímetros do chão para não cair. Repeti a frase da jovem mulher: - Porque é que estás a usar a cabeça? Meu Deus, por que raio é que hás-de usar a cabeça? Vivemos no tempo em que tudo está feito para nós...Toda a papinha está mastigada. Segui naquela risota até às raparigas s

Não Gosto (50)

Não gosto de saber e ver que umas celebridades são casadas com outras celebridades. Quando oiço falar de mais um casamento entre dois famosos fico furioso. O facto de, na maior parte das vezes, os VIP’s se casarem uns com os outros faz-me olhar para o amor e para o casamento como uma coisa artificial e sem valor. É uma grande e estranha coincidência as pessoas famosas encontrarem o amor da sua vida entre outras famosas porque há tantas pessoas no mundo, tão diferentes entre si, por que raio hão-de ter encontrar a pessoa com quem partilharão a vida nos fechados e obtusos meios que frequentam? Para mim, como já disse noutras ocasiões, o casamento é uma instituição caduca e ultrapassada; não faz qualquer sentido nos dias de hoje, em que há uma grande mobilidade e todas as pessoas se podem encontrar, casar e dedicar a vida a apenas uma pessoa, mas estes casamentos entre VIP’s parecem-me uma coisa “só para inglês ver”, como se diz na gíria, para vender notícias com fotos pomposas, para ver

Não Gosto (49) (P)

Não gosto de pessoas que, quando se referem a balizas de futebol, dizem poste em vez de dizer barra, ou que dizem barra em vez de dizer poste. Se não sabem ao certo qual a expressão que usar digam “ferro”. “A bola foi ao ferro”. Eu, pessoalmente, consigo sempre ver se a bola vai ao poste ou à barra, mas compreendo que algumas pessoas não consigam ver. Para elas existe essa expressão do ferro, que engloba todas as fronteiras férreas da baliza.

Gosto (62)

Gosto de me sentar em lugares nos quais a vista que albergo é perfeitamente simétrica. Por vezes fico sentado durante horas em bancos de jardim, a olhar para a perfeita simetria dos jardins habilmente construídos para o prazer dos homens por talentosos escultores de flores. Faz-me sentir uma serenidade indescritível, sinto que me fundo com a Natureza e que a Natureza se funde comigo.

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (13 de Fevereiro de 2016)

Enquanto folheava um livro policial em checo e lia frases aleatoriamente, deparei-me com uma palavra que causou em mim uma forte impressão. A palavra era "smrt". Descrever a impressão que essa palavra me causou ainda se me afigura como algo muito difícil. Para além de ter sentido um calafrio, fiquei muito curioso por saber o seu significado, mas também fiquei ensombrado, de certa forma e não sabia explicar por quê. Li 200 ou 300 palavras desse livro, mas só "smrt" ficou gravada na minha cabeça. Algo muito misterioso acerca desta palavra é o facto de ela ser composta apenas por consoantes, o que me fez estranhar muito, uma vez que não existem palavras só com consoantes na língua portuguesa. Saí da livraria para as ruas de Praga que pululavam de vida, mas não havia muitos checos naquela zona. A capital da República Checa foi tomada por turistas e, neste dia específico, parecia-me ter mais russos e coreanos que checos, por isso custou-me arranjar alguém naquela rua par

Não Gosto (48) (P)

Não gosto de não conseguir adormecer. Para mim, é um grande sentimento de impotência, ficar às voltas na cama, sem conseguir pregar olho, vendo, por vezes, a manhã solarenga esgueirar-se entre os buracos da persiana, o que me causa um imenso peso na alma. Eu, pelo menos, sinto-me um verdadeiro idiota e censuro-me pelo tempo que perco a debater-me com os lençóis húmidos do suor de uma noite de verão e, por vezes, sinto-me tão quente que acho que vou arder de loucura enquanto dou voltas e voltas em busca da posição perfeita e nunca consigo acabar com essa pequena farsa que é estar para ali, às voltas na cama a ver se durmo. Era simples: levantava-me da cama e ia fazer outra coisa, mas sou incapaz, fico sempre à espera que o sono chegue e, por vezes, demora horas. Uma coisa que me costuma ajudar a adormecer é a masturbação. Costumo masturbar-me duas, três vezes por noite, mais caso esteja com muita dificuldade em adormecer. Depois disso fico mais relaxado e é mais fácil passar a ser embal

Voda parece vida, mas é água

O tempo não cede à passagem dos segundos imperdoáveis Mas o vento cede as estruturas de alta voltagem Irremediáveis estalidos eléctricos explodem de novo No coração, na alma, nas veias inconquistáveis É hora de correr para a morte repetida Está na hora, está na hora Os cães ladram ao longe e o galo assustado não vai cantar esta madrugada Iluminada por um amanhecer sangrento nas colinas E ao longe vogou a densa sombra da morte Os seus fantasmas, mais perto, nas cortinas Encantavam-me para a vida e para a sorte Nadir Veld

Os Diários Lunáticos de Zenit Saphyr (23 de Maio de 1976)

A sorte é uma vagabunda deambulando na vida à espera de ser nomeada. É uma incógnita, é o que acontece. A sorte é o devir e o julgamento do merecimento vem no futuro com esse devir. Podemos ter tido sorte ou não no entretanto. Há pessoas cuja sorte praticamente não existe, não tem hipóteses de se efectivar por um elevado número de razões, nomeadamente geográficas. Há sítios em que há pouca sorte a pairar na atmosfera e o azar em todas as ruínas cai sob a forma de pó e estuque. Aprisionados nesse azar os seres humanos tentam sair a não ser que tenham metralhas e estejam aos comandos dos Senhores da Guerra, então, nesse caso, têm muita acção pela frente, há que pilhar essas cidades todas, despojar o bem da terra, servir os Senhores do Inferno, os Senhores do Mundo, propagando azar durante imortais gerações. A História foi demasiadas vezes contada, todos sabemos o que aconteceu com a sorte e com o azar no outro dia. Desde Jesus, e até antes dele, homens armados conspiram na sombra congemi

Gosto (61) (P)

Gosto de ter as unhas das minhas mãos cortadas assimetricamente. Quando corto as unhas nunca o faço de maneira a que fiquem todas cortadas, deixo, normalmente, duas em cada mão por cortar. As unhas são um instrumento utilitário que pode dar bastante jeito, sinceramente não entendo por que raio é que as pessoas cortam as unhas todas, privando-se a si próprias de um excelente utensílio. Por exemplo, se uma pessoa tem uma comichão, pode coçar-se com o dedo sem unha, mas esse coçar não garante o mesmo prazer que o arranhar com a unha garante. Falo de comichão, mas poderia falar de milhares de outras utilizações da unha das quais se privam as pessoas que, estupidamente, cortam todas as unhas da mão. Há alguma razão para as pessoas terem as unhas todas cortadinhas? Já fui gozado por muitos dos meus amigos por ter as unhas assimétricas, umas cortadas outras não, coisas como "és mesmo cabeça no ar, Zenit", "olha para as unhas deste gajo", gargalhadas sem fim e tudo mais. Eu